sexta-feira, 27 de abril de 2007

Palavraprecipício


“Un pion pourrait se faire un bagage littéraire,
en disant le contraire de ce qu’ont dit les poètes de ce siècle.
Il remplacerait leurs affirmations par des négations.”

Isidore Ducasse


Não sei ao certo de que buracos
saíram estas noites que vagam por aí, como vírus,
apunhalando-me os nervos com tal violência,
feito uma nova vileza secreta.

Guardo um velho sonho , uma mordida seca e larga,
uma mão miúda, como a de minha mãe,
que me embala e me espanca,
jogando-me dentro de uma rede encardida,
coberta por um mosqueteiro.

Posso ver seus olhos outra vez...

Guardo uma cicatriz desconhecida,
feita de falta de trabalho ou de tempo.
Talvez uma tristeza de quem já não consegue ser nada.

Sofrer não é muito diferente de fugir.
Seria uma merda se um desconsolo ou outra coisa
pudesse ser adiada até o desaparecimento.

É fácil ser influenciado pela morte.
E penso sempre o mesmo,
se existirá a ausência de movimento,
se não seria melhor ficar em casa
mais tempo, mais vezes.

Claro que já não tenho mais sangue no coração.
É uma das condições que me fazem
calar sobre o que me cerca.
Não preciso estar triste para destruir seja o que for.

Meus amigos têm medo que eu morra,
eu que sempre exercitei a covardia,
a indiferença, o tédio,
a desgraça. Eu que perdi toda a dignidade.

Quando faz sol, as ruas vestem-se de pessoas
que evitam o sol com as mãos abertas. O sol é triste.
Parece uma palavra caindo do céu.

O mundo junta os pedaços,
junta as peças debaixo de meus pés.

O sol parou. Caras desconhecidas enchem-me o coração.
Projeto meu futuro esquecendo delas.
Saindo de um motel pra beber cerveja.
Mal disposto como quem está preste a nascer.

Alguém me abandona nisto.
O dia sobe como uma pedra. As pessoas desaparecem.

3 comentários:

Benny Franklin disse...

Pedro, Salve!
Beleza de texto. Palavras de fina estampa.
Abçs, Benny Franklin

Pedro Vianna disse...

Valeu Benny.
Vamos trocar nossos livros qd der...

Sancho Produçoes disse...

amei , muito bom mesmo!