quarta-feira, 28 de novembro de 2012

teste


https://www.facebook.com/media/set/?set=a.294694840611139.70141.100002118773421&type=3


este estertor

estéril



este rosto
estreito



este rasto
retrátil



(isto)
está 
restrito



a este
rito
:
atear
taras



tatear
tetas



tear
arte

sexta-feira, 22 de junho de 2012

propriedade


























“Peste! 'tis his own songs?
Or some other's that he sings?”
Ezra Pound


ó metáfora natimorta
– feto infectado –
esculpindo outras mãos
no sexo
do poema


onde esconder
tua voragem destrutiva
teu funcionamento
de máquina
?


os santos riem de
tua alma
ready-made &
cospem
em teu coração
trans – vegetal – plantado


eu te recolho
de um secular abandono
para construir
o esqueleto
desta canção fratricida

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

porcelana de Celan

foto:pedro vianna


meu

inapto

corpo


opta

pelo

pouco


da palavra

capta

uma letra

&

expele a pele

de uma

estrofe


do vazio

de sua

busca


sou o

primeiro

a beber

domingo, 11 de dezembro de 2011

Sugestões para melhorar a Imagem Pública dos Beatniks


Carl Solomon, Patti Smith, Allen Ginsberg e Willian Burroughs


O mais importante agora é mudar o cheiro dos Beatniks. Ao invés de usarem, por exemplo, a palavra ”merda” tantas vezes em seus poemas, eu sugiro que eles taticamente substituam pela palavra “rosa” onde quer que a outra palavra ocorra.

Isso é apenas um pequeno ajuste.

Isso é tão igualmente AVANT GARDE que a arte não sofrerá prejuízos.

Ao invés de dizer “MERDE” eles dirão “Uma rosa é uma rosa é uma rosa.” Tão AVANT GARDE, podem ver, com uma considerável melhora no efeito criado.


Carl Solomon
Tradução: Pedro Vianna

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Carl Solomon




“…que jogaram salada de batatas nas palestras sobre Dadaísmo na CCNY e posteriormente se apresentaram nos degraus de granito do hospício com a cabeça raspada e fala de arlequim suicida, exigindo lobotomia instantânea...”


(Do Uivo (para Carl Solomon) de Allen Ginsberg)


Sim, Carl Solomon realmente jogou salada de batatas durante uma palestra sobre dadaísmo no City College de Nova Iorque. Ao fazer isso, ele e seus amigos estavam realizando uma performance artística, mas anos mais tarde, quando Solomon pediu uma lobotomia para acabar com sua angústia psicótica ele não estava sendo nada artístico.


Solomon, nascido em 30 de março de 1928 no Bronx, é mais famoso por ter inspirado o poema "Howl", do que por qualquer de suas próprias realizações. Ele e Ginsberg se reuniram em uma sala de espera em um hospital psiquiátrico, onde Ginsberg foi visitar sua mãe. Solomon era interno lá. Apesar de seus problemas mentais, ele tinha uma inteligência hiperativa, e foi capaz de instruir Ginsberg em vários pontos literários, apesar do fato de Ginsberg ter dois anos a mais.


O tio de Carl Solomon era AA Wyn, editor de livros de bolso da Ace. Carl trabalhou intermitentemente com seu tio, e Ginsberg uniu-se a Carl e seu tio para ajudar a publicar os seus, então impublicáveis, ​​amigos William S. Burroughs e Jack Kerouac. A Ace finalmente utilizou o romance, "Junky Burroughs", como metade de um thriller barato de "Dois livros em um". Mas eles estavam entre os muitos editores que rejeitaram "On The Road" de Kerouac.


Solomon nunca foi realmente um escritor, embora os leitores de "Howl", muitas vezes acreditem que ele era. Tarde na vida, ele atendeu a essa expectativa ao escrever dois livros de ensaios elípticos, psicóticos e eruditos e curiosamente curtos: "Mishap, Perhaps " em 1966 e " More Mishaps " em 1968. Seu " Emergency Messages ", na mesma linha, foi publicado em 1989.É interessante que Kerouac, Ginsberg e Burroughs viajaram cada um com um "fantasma" – uma imagem no espelho com menos formação literária, mas mais "autenticidade". Kerouac teve o espírito livre e carismático de Neal Cassady, Burroughs teve a malandragem junkie das ruas de Herbert Huncke. Ginsberg, que sempre parecia inspirar o estado de insanidade, teve Carl Solomon.


Texto: Levi Asher

Tradução: Pedro Vianna

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O VESTIDO







Para desespero de Valquíria, o vestido só chegou às quatro. Quando a costureira bateu à porta ela desceu as escadas em disparada, pouco importando-se com as recém-feitas unhas dos pés. Entregou algumas notas à mulher gorda e suada postada à porta, e não teve ímpeto algum de agradecer ou se despedir. Abraçou o pacote como quem abraça um filho recém-nascido e correu de volta ao quarto, escada acima.



Já no quarto, Valquíria não conseguia conter o entusiasmo. Rasgou o pacote e arrancou de dentro o vestido há tanto esperado. Conferiu a simetria do modelo, os acabamentos da costura e deu-se por satisfeita. Tudo estava conforme o esperado. Suspendeu a peça diante do corpo e postou-se frente ao espelho. Era realmente um belo vestido. Por mais que ele fosse desatento, não deixaria de notar isso.



Pouco antes das cinco começaram os preparativos. Valquíria chamou as empregadas e recomendou capricho no suco e nos canapés. Eduardo chegaria às sete e ela não admitiria falhas por parte das serviçais. Após determinar as instruções sentou-se à penteadeira e pôs-se a pentear os longos cabelos. Nada ofuscaria o brilho daquela noite, e ela teria de estar impecável.



Ao experimentar o vestido, não pode deixar de sentir uma pontinha de orgulho e vaidade diante do que lhe oferecia o espelho. Definitivamente ela achou-se linda. Que mais poderia esperar um homem como Eduardo em plena noite de noivado? Ela já imaginava seus olhos deslumbrados, seus elogios, sua cordialidade elegante, e antegozava o momento quando ele chamaria seus pais e faria o tão esperado pedido.



Valquíria sentou-se no sofá da sala de visitas, depois de passar uma ultima vista no ambiente em busca de qualquer imperfeição. O relógio marcava então seis e trinta, Eduardo chegaria às sete. Conferiu as unhas das mãos, alisou no corpo o vestido e pediu à empregada um espelho e uma escova de cabelo. Pensava em todo o tempo que esperara por esse momento. Pensava encontros escusos, longe dos olhos da família e sentia uma espécie de prazer secreto em lembrar tudo isso.



Passavam 15 minutos das sete quando o pai de Valquíria entrou na sala com a câmera fotográfica nas mãos. A ansiedade da moça era mais que visível e o pai propôs uma foto na tentativa de acalmá-la um pouco. Seria, em suas palavras, a última foto de solteira da filha. Valquíria ajeitou-se no sofá, mas só conseguiu esboçar a sombra de um sorriso diante da situação. O pai deu-lhe um beijo na testa e pediu-lhe calma, afinal, ninguém estava isento de algum imprevisto.


Antes de o relógio marcar nove horas Valquíria levantou-se do sofá, subiu com calma as escadas e trancou-se no quarto. Diante do espelho ela mais uma vez conferiu o cabelo, o rosto, o vestido, e passou alguns minutos perdida entre a contemplação de sua imagem e a compreensão do ocorrido. Talvez Eduardo estivesse indeciso. Talvez de fato algum imprevisto ou um acidente. Quem sabe um parente morto ou adoecido. Talvez até o próprio Eduardo morto.



Mas era melhor não pensar nisso. O melhor a fazer era não tirar o vestido. E se Eduardo chegasse a qualquer momento? E se estivesse a caminho, preocupado, eufórico, em desespero pelo ocorrido. Sim, o melhor a fazer era não tirar o vestido. Valquíria sentou-se na cama e encontrou na posta dos sapatos alguma distração. Até que esse exercício, quase sem sentido, a fez adormecer vestida sobre a cama.



Adormeceu vestida sobre seus sonhos. Adormeceu vestida sobre a sombra de um homem que nunca veio. Adormeceu vestida de seus anseios.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

umas & outras


imagem: Paulo Ponte Souza

umas sim
outras não

umas vem
outras vão

umas nem
outras tão

umas tem
outras dão

umas sem
outras são

umas zen
outras cão

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

ordálio

Nelson Magalhães Filho.

ANJOS BALDIOS 2009,

acrílica s/tela, 140X200 cm



sob um súbito céu de chumbo

atiro ao rio esta palavra-pedra

retirada à força de um velho texto

há pouco lido & já esquecido


já sem rancor ou piedade

assisto à sua inútil batalha

– sílaba a sílaba soletrada –

sobre a página silente das águas


de sua respiração sufocada

surgem outros novos significados

à margem de minha vontade:

ecos de uma canção submersa


vejo & não vejo seu corpo

– ração devorada por peixes –

descer ao mais-fundo-fim

do negro rio da linguagem


e quase ouço seu silêncio

unindo-se à voz dos afogados

numa oração incompleta

feita de espera e ausência


eis que da treva profunda

das líquidas entranhas do tempo

surge a sombra de um verbo

manchando o dorso das águas


e retornas às minhas mãos

– ó íntima nau ressurreta –

não mais palavra ou pedra

mas revelação do juízo apenas:


frio cadáver do poema


sexta-feira, 21 de maio de 2010

a criação do nu



reina sobre minha visão

a imagem quase-abstrata

do um corpo diluído

& transfigurado

pelo hálito incestuoso

de Rimbaud


seus cabelos (roubados

de um cavalo morto)

desenham uma trajetória

instintiva no calcinado

coração dos loucos


antes que a noite caia

sobre o horto incendiado

da luxúria, uma luz

há de romper sua estática

submissão agonista


& deformar sua figura

corrompida por minhas mãos

de carícias homicidas

segunda-feira, 19 de abril de 2010

IAP divulga contemplados com Bolsa de Literatura

O Instituto de Artes do Pará (IAP) divulgou na última quinta-feira, 15, o resultado do Prêmio IAP de Edições Culturais 2010 e da Bolsa de Pesquisa, Experimentação e Criação em Artes Literárias 2010. Para a Bolsa de Pesquisa foram contemplados os projetos “Eutanásio”, de Nilson Oliveira, e “Identidade Solar”, de Pedro Vianna. O júri foi composto pelos poetas Antônio Moura e Marcílio Costa.

Já o Prêmio IAP de Edições Culturais contemplou quatro autores, que terão seus livros publicados pelo instituto. No gênero Auto Popular, o escolhido pelo júri, integrado pelo dramaturgo Nazareno Tourinho e pela professora de teatro Olinda Charone, foi o trabalho “O Filho do Sereno”, de Raimundo Harles Oliveira Carneiro. No gênero Ensaio, o júri, contemplou a obra “Andara: Vicente Franz Cecim e a Narrativa Ontológica”, de Karina Jucá. Os trabalhos inscritos foram avaliados pelas prfessoras Marisa Mokarzel e Amarílis Tupiassu.

No gênero Cordel, foram vencedores dois trabalhos: “O Menino que Ouvia Estrelas e se Sonhava Canoeiro”, de Antônio Juraci Siqueira; e “Tempos Melhores Virão”, de Jaziane Almeida Malcher. Nesta categoria, o júri foi formado pelos doutores em Literatura Oral José Guilherme de Oliveira Castro e José Guilherme dos Santos Fernandes. As duas obras serão editadas em um mesmo volume da categoria Cordel.

Em 2010, o Prêmio IAP de Artes Literárias foi dividido em Prêmio IAP de Edições Culturais, voltado aos gêneros Auto Popular, Ensaio e Cordel – este último incluso pela primeira vez na premiação, reforçando a valorização da cultura e tradições populares -, e Bolsa de Pesquisa, Experimentação e Criação em Artes Literárias, cujo objetivo é estimular a investigação e a concepção de novos caminhos temáticos e formais para a literatura produzida no Pará, buscando, ao mesmo tempo, interrogar suas raízes mais genuínas (pesquisa) e ampliar seus horizontes teóricos e práticos (pesquisa e experimentação).

O escritor Vicente Franz Cecim, da gerência de Artes Literárias, explica como surgiu a ideia da criação da bolsa. “Ao longo desses anos, através da realização do Prêmio IAP, conhecemos mais de perto as necessidades dos autores e percebemos que precisávamos estimular a pesquisa em literatura, permitindo que os autores estudem e façam experimentações em termos de linguagem e nas temáticas e, nesse processo, inserir a literatura paraense na contemporaneidade”.

Nilson Oliveira, contemplado com a Bolsa de Pesquisa, comentou sobre a importância do Prêmio IAP, já que é a primeira vez que um órgão dá bolsas de pesquisa literária no Pará. “O trabalho do IAP é, sem dúvida, singular. Muito do que tem acontecido de expressivo na cena artística paraense, em termos de literatura, artes plásticas e visuais, passa pelos agenciamentos do IAP. É um acontecimento visível, algo saudável para os desdobramentos da cena. No caso mais especifico das bolsas de pesquisa literária, essa iniciativa cumpre um papel fundamental para os novos rumos da literatura, uma vez que possibilita condições para o escritor criar, experimentar, desenvolver seu trabalho. É uma bela iniciativa!”

Para Karina Jucá Ferreira, a seleção de seu trabalho foi a premiação de um projeto antigo. “Foi meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) de 2003 e estava engavetado. Mas, era um sonho antigo publicá-lo. Sou poeta também e pretendo publicar meus poemas, mas gosto muito de ensaios e críticas”.

O IAP publicará três livros, com tiragem de mil exemplares cada, cabendo aos seus autores 500 exemplares, permanecendo 500 exemplares no IAP, para divulgação institucional da obra e doação a bibliotecas públicas.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Homem na rua


O fantasma de um gênio - Paul Klee

.

Tropeçando pela rua sombria, estreita,

você ouve passos seguindo lentos o seu aquiescer,

verifica ao parar, e oh, quão bem há de saber

que forma, no infinito, seu destino espreita:

a si mesmo, retido para dar-lhe a chance de crescer.

.

Robert Stock

Tradução: Pedro Vianna

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

sensação


Francis Bacon - Self Portrait
surge um movimento
de contraturas e paralisias
migrando da forma
acessória da palavra
para o útero das abjeções

um órgão indeterminado
captura a insistência
de um grito que subsiste
à boca, cuspindo
cognições transitórias
:
carne & nervo
delineando níveis
para os limites da crueldade

vibra a hipótese de
uma corporeidade rítmica
onde o próprio ritmo
- tambor de Cronos -
é insuficiente
e mergulha no caos

quarta-feira, 4 de novembro de 2009



quarta-feira, 10 de junho de 2009

poema feito com as mãos



conduzir a fluídica
pulsação da palavra
pelo labirinto da
fala


compor um ritmo
compulsivo com a fálica
obsessão da escrita


capturar em suas
entranhas o selvagem
coração da noite


- criar a palavra-tambor -

sentir as estranhas
vibrações de sua
dicção percussiva


penetrar a selva
da linguagem
& num rufar monstruoso

fazer ecoar pelo
corpo acústico do poema
seu ressuscitado


batuque ancestral

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

creature


Words are Sweet Sounds for Objects Unreal
- Justin Simoni


fiz este poema
...........à minha imagem
& semelhança:

frágil templo
...........de palavras
consumidas
...........pelo tempo

domingo, 7 de setembro de 2008

Roberto Juarroz: a vertigem da linguagem


por Pedro Vianna

Todo o trabalho poético do argentino Roberto Juarroz carrega um título único que determina o sentido preciso e intransponível de sua escritura: poesia vertical. Sua aproximação com o espaço literário constrói-se num discurso imagético-conceitual desenvolvido em sua poética, tornando-se uma rigorosa aventura de enfrentamento da palavra através da feitura quase arquitetônica do poema. Há uma espécie de campo de força existencial nos poemas de Juarroz que ultrapassa os limites da linguagem enquanto mera especulação lógica. "Uma poesia que procede pela inversão dos signos", disse Julio Cortazar. De fato os poemas de Juarroz flertam diretamente com o outro, o insólito, o inesperado, o inacreditável, mesmo que o poeta se expresse de forma relativamente clara. Há uma direção e um sentido, ainda que essencialmente abstratos buscados pelo poeta e suas palavras. E nisto consiste a vertigem da verticalidade de sua criação.

Esta vertigem da escritura faz fronteira simultaneamente com o invisível e a existência, criando um espaço de reflexão que confluí para um ponto onde o poema se abre, explode ("Pero el hombre / allí no tendrá peso, / allí no será nadie"). Esta é uma poesia de confrontação direta com as limitações da linguagem, revelando de modo admirável seu poder, sua miséria. Somos impelidos a mover-nos assim em um ambiente onde as dúvidas materializam-se como uma experiência de comunicação com o essencial. Neste processo de incisiva agressividade o poeta vê, sente, respira através de suas palavras, pondo à prova os próprios limites da literatura através da manipulação de uma linguagem simples, uma linguagem de natureza elementar, que desnuda os fundamentos que permanecem ("Detrás del silencio, / detrás del espacio vacío, / detrás de lo que no existe”). Buscando um reencontro com a palavra que é a representação da própria vida, ou como pretendia Artaud com “a Palavra anterior às palavras”.

A palavra em Juarroz é animada por tensões que nos revelam uma intensa vontade de conhecimento. Sua identidade é determinada por seu próprio reflexo. É como se a evidencia da impossibilidade de sua revelação, traçasse um itinerário dissimulado onde a palavra, sem sustentar-se no solo de uma rigorosa síntese essencial, dissolva-se em sua própria miséria. Em suas próprias palavras: "la palabra no es el grito, / sino recibimiento o despedida. / La palabra es el resumen del silencio, / del silencio, que es resumen de todo". Juarroz parece acreditar na palavra como uma forma de transpor a superficialidade histórica dos fatos, ou como disse Derrida: “Sobretudo quando esta questão histórica, num sentido insólito, se aproxima de um ponto em que a natureza puramente assinaladora da linguagem parece muito incerta, parcial ou inessencial”. Utilizando a força da poesia como instrumento particular de batalha contra a própria credibilidade da palavra, a inquietude do silêncio demarca o território verbal de Juarroz e está tragicamente presente em sua aventura poética.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Os fragmentos da Semente


Karen Stiehl Osborn - Fragment 7

por Antonio Moura*

Em seu segundo livro, o poeta Pedro Vianna retoma, ou seria melhor dizer, prossegue em um itinerário em que o espaço urbano é o espaço para a apreensão do fenômeno. E aqui o fenômeno é o poema, que se manifesta ainda de maneira amorfa nos eventos e transforma-se em verbo. E como uma metáfora ou duplo do espaço e tempo, aqui, urbano, o poema assinala a fragmentação como elemento determinante em sua configuração.

Desde a sua grafia, o poema tem, paradoxalmente, no fragmento a sua unidade: a fragmentação visual, através do olhar que depara com o espacejamento fraturado do texto; a fragmentação rítmica, que compõe um sonoridade em staccato ao longo de toda a leitura e, por último – mas não menos importante na totalidade do poema – a fragmentação psíquica a que o sujeito, tanto no interior da cidade quanto no interior do poema, está exposto. Fragmentos de luz, de sombra, fragmentos do desejo, da repulsa, fragmentos do corpo, da mente, armando e desarmando jogos de montar e desmontar a memória, a infância, o cotidiano, a história, o mito, o silêncio e a palavra. Este é um espaço onde a poética se desenrola através da acumulação de sentidos, numa voz lírica impessoal e indeterminada, num lugar onde “Nem/ a áspera língua do poeta/ estendida/ no/ chão/ vazado das palafitas/ como/ cadáver das marés/ anoitecidas/ em/ círios/ de embriaguez exaltada/ traz algum/ resquício de conforto/ para a/ triste/ &/ promíscua procissão/ de almas/ em convulsa monotonia. Cenário onde a miséria social e a miséria anímica se fundem num pesadelo onde nada acena com um possível conforto.

Já havia assinalado em relação ao seu primeiro livro, Itinerário Interno, que, apesar de centralizado num eu lírico, o verdadeiro personagem do texto era o caminho, de fora para dentro, percorrido por um olhar transfigurador, que, a meu ver, é inerente a arte e a poesia. Neste trabalho presente o itinerário interno continua, só que numa tensão ainda maior em que “um movimento denso/ construindo/ cicatrizes/ na arquitetura imaginária/ do/ tempo/ perdido/ amortece/ os nervos/ da cidade metálica/ alimentando/ a fúria dos barcos/ entre aromas/ &/ carnificina/ onde/ a morte foi seqüestrada/ pelos espelhos/ da/ infância. Uma fratura permanente na paisagem, nos objetos, no sujeito e na temporalidade que engloba a memória da infância lançada para o presente com todo o peso das coisas existentes, num “horizonte encarcerado”, quase sempre provocante e hostil.

*Antônio Moura nasceu em Belém do Pará, em 1964. Publicou, em 1996, o livro "Dez", selecionado pela Universidade de Madri -Departamento de Filologia, para integrar a antologia internacional de poesia e crítica "Serta", reunindo poetas de línguas ibero-românicas, entre eles o poeta, tradutor e crítico literário Haroldo de Campos.Roteirista de cinema e vídeo, Antônio Moura atua nesta área como professor no Centro de Comunicações e Artes do Senac-SP. Trabalhou na realização do roteiro do médiametragem "Geraldo Filme", ganhador do prêmio de melhor filme brasileiro no "It's AU True - Festival Internacional de Documentários de São Paulo" e do Prémio Especial do Júri, no 26ª Festival Latino-Americano de Gramado. Colaborou ainda como tradutor no site O Poema.Em 1999, lançou seu segundo livro de poemas intitulado "Hong Kong & outros poemas", pela Ateliê Editorial, com prefácio de Benedito Nunes.Tem seus poemas publicados nas antologias Serta, de Madri e New American Wrighters, EUA, (traduzidos para o inglês). Além da antologia de poesia brasileira Poesia de Invenção no Brasil, editora Landi, São Paulo, 2002.Lança pela Lumme Editor de São Paulo o livro de poemas "Rio Silêncio" no Brasil e em Portugal, que foi muito bem recebido pela crítica do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, despertando em revistas de forte cunho literário como a carioca Inimigo Rumor, do poeta Carlito Azevedo, a Revista Zunai, do poeta e crítico paulista Claudio Daniel, e a Medusa de Curitiba, o interesse em publicar matérias em suas páginas sobre sua obra.No mesmo período publica "Quase-Sonhos", com tradução dos poemas do poeta africano nascido em Madagascar, Jean-Joseph Rabearivelo, portanto, de língua francesa e totalmente inédito no Brasil.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

A estranha mensagem



Ele veio nas trevas quando havia silêncio
e de novo trouxe a ternura dos galhos tombando para a madrugada.
Eu subi do fundo do mar como um líquen liberto
para ouvir a sua voz que era imensa
e trazia a ansiedade das flores explodindo,
mas só vi o silêncio enorme como a noite.
E ela chorou dentro de minha tristeza
porque era como a revelação do que eu havia perdido.
Ainda trazia nas mãos o frio dos troncos úmidos da noite,
e nos olhos a humildade da terra encharcada de chuva.

Um dia eu descerei verticalmente e para sempre
ao fundo deste mar onde ela mora
como um barco de pescadores desaparecidos.



Paulo Plínio Abreu

segunda-feira, 7 de julho de 2008

o velho

para Ronaldo Freitas


que sonhos sonha
xxxxxxxxxxcom óculos tortos
& um livro sobre o peito
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxo velho e seu 
ronco engasgado

como se a morte
xxxxxxxxxxviesse a todo 
instante cortejar
seu leito incólume

xxxxxxxxxx& a vida fosse
um mero lamento
regado a cerveja 
xxxxxxxxxx& cigarro

num eterno 
arrastar de sandálias
xxxxxxxxxxxxxxxxxxpelo infinito
da madrugada 


sexta-feira, 4 de julho de 2008

happening



o louco persegue
a insígnia incendiária
do sol
num bailado oriental

sobra sobre
a janela um
pobre poema
sob o sal
do deserto
:

uma palavra-sopro
desfaz a pálida
voz do vento

terça-feira, 1 de julho de 2008

Curtas metragens alemães e poesia contemporânea paraense.

Nesta quarta-feira, dia 2 de julho, quem curte cinema e literatura em Belém vai contar uma programação especial para o final de tarde. A partir das cinco horas, no espaço de ensaios da loja Ná Figueredo, vai acontecer o coquetel de pré-lançamento do Circuito Cultural Semeadura. O evento será uma prévia da programação que começará oficialmente em agosto e pretende movimentar eventos, idéias e discussões sobre literatura, cinema e arte contemporânea em geral na cidade. 

 A programação começará com a projeção de 5 curtas-metragens alemães cedidos pelo Instituto Cultural Amazônia. São curtas independentes de uma academia de cinema alemã chamada Baden Wutenberg Academy, todos produzidos por estudantes de cinema com apoio de cineastas famosos, como Wim Wenders. A Exibição desses curtas no Brasil foi a contrapartida do ICAB para a Mostra de cinema da Amazônia na Alemanha, realizando assim o intercambio cultural entre os dois países. Alguns desses curtas foram selecionados para o Student Academy Awards europeu.

 Em seguida o poeta paraense Pedro Vianna fará a leitura de alguns poemas de seu novo livro, Sementes da Revolta. O livro, vencedor do I Prêmio Ipiranga de Literatura, foi bem recebido crítica, tendo sido prefaciado pelos renomados poetas João de Jesus Paes Loureiro e Antonio Moura. Sementes da Revolta é o segundo livro da carreira de Pedro Vianna e foi lançado no último dia 21 de junho. Esta será a primeira oportunidade do poeta de ler e trocar impressões sobre o texto recém saído da gráfica com o público.

 A programação terminará com uma mesa redonda com time de peso discutindo poesia contemporânea. Os convidados são: Antonio Moura, autor de Dez (Gráfica & Editora Supercores, 1996); Hong Kong & outros poemas (Ateliê Editorial, 1999); e Rio Silêncio (Lumme Editor, 2003). Nilson Oliveira, autor de A Outra Morte de Haroldo Maranhão (Edições IAP, 2006), Benoni Araújo autor de Não por acaso dispersos (Inédito) e Pedro Vianna, autor de Itinerário Interno (Edição do Autor, 2007); e Sementes da Revolta (Fundação Ipiranga, 2008) que pretendem abordar a temática: Poéticas da Transgressão. 


sexta-feira, 27 de junho de 2008

Coquetel de Pré-lançamento do Circuito Semeadura




naufrágio íntimo



Acrílica, pastel seco e nanquim sobre tela - Paulo Ponte Souza

a solidão é tátil:
título de um livro
que se inscreve
em tempo
& ausência

esmorecer
de uma espera:
íntimo naufrágio

a solidão dispensa 
metáforas ou
soluções de estilo

sua língua é
o estilete
sua página
a pele




domingo, 22 de junho de 2008

Matéria Jornal Liberal 21/ 06/ 2008 "Pedro Vianna lança hoje livro de poemas"

















Foto: Eduardo Souza

'Sementes da Revolta' está sendo publicado como prêmio por um concurso editorial
O poeta Pedro Vianna lança hoje, no Colégio Ipiranga (avenida Almirante Barroso, entre Humaitá e Vileta), o livro Sementes da Revolta, publicado como premiação do concurso de poesia promovido pela Fundação Ipiranga, no qual ele tirou em primeiro lugar. Sobre o livro, o também poeta Antônio Moura escreveu:

Em seu segundo livro, o poeta Pedro Vianna retoma, ou seria melhor dizer, prossegue em um itinerário em que o espaço urbano é o espaço para a apreensão do fenômeno. E aqui o fenômeno é o poema, que se manifesta ainda de maneira amorfa nos eventos e transforma-se em verbo. E como uma metáfora ou duplo do espaço e tempo, aqui, urbano, o poema assinala a fragmentação como elemento determinante em sua configuração.

Desde a sua grafia, o poema tem, paradoxalmente, no fragmento a sua unidade: a fragmentação visual, através do olhar que depara com o espacejamento fraturado do texto; a fragmentação rítmica, que compõe um sonoridade em staccato ao longo de toda a leitura e, por último - mas não menos importante na totalidade do poema - a fragmentação psíquica a que o sujeito, tanto no interior da cidade quanto no interior do poema, está exposto. Fragmentos de luz, de sombra, fragmentos do desejo, da repulsa, fragmentos do corpo, da mente, armando e desarmando jogos de montar e desmontar a memória, a infância, o cotidiano, a história, o mito, o silêncio e a palavra. Este é um espaço onde a poética se desenrola através da acumulação de sentidos, numa voz lírica impessoal e indeterminada, num lugar onde 'Nem/ a áspera língua do poeta/ estendida/ no/ chão/ vazado das palafitas/ como/ cadáver das marés/ anoitecidas/ em/ círios/ de embriaguez exaltada/ traz algum/ resquício de conforto/ para a/ triste/ &/ promíscua procissão/ de almas/ em convulsa monotonia. Cenário onde a miséria social e a miséria anímica se fundem num pesadelo onde nada acena com um possível conforto.

Já havia assinalado em relação ao seu primeiro livro, Itinerário Interno, que, apesar de centralizado num eu lírico, o verdadeiro personagem do texto era o caminho, de fora para dentro, percorrido por um olhar transfigurador, que, a meu ver, é inerente a arte e a poesia. Neste trabalho presente o itinerário interno continua, só que numa tensão ainda maior em que 'um movimento denso/ construindo/ cicatrizes/ na arquitetura imaginária/ do/ tempo/ perdido/ amortece/ os nervos/ da cidade metálica/ alimentando/ a fúria dos barcos/ entre aromas/ &/ carnificina/ onde/ a morte foi seqüestrada/ pelos espelhos/ da/ infância. Uma fratura permanente na paisagem, nos objetos, no sujeito e na temporalidade que engloba a memória da infância lançada para o presente com todo o peso das coisas existentes, num 'horizonte encarcerado', quase sempre provocante e hostil.


quarta-feira, 23 de abril de 2008

Algum dia


(para Narjara Oliveira,
esta tradução que tudo traduz.)
Algum dia encontrarei uma palavra
que penetre teu ventre e o fecunde,
que pare em teu seio
como uma mão aberta e fechada ao mesmo tempo.

Acharei uma palavra
que detenha teu corpo e o entorne,
que contenha teu corpo
e abra teus olhos como um deus sem nuvens
e use tua saliva
e te dobre as pernas.
Tu talvez não a escutes
ou talvez não a compreendas.
Não será necessário.
Irá por teu interior como uma roda
percorrendo-te ao fim de ponta a ponta,
mulher minha e não minha
e não se deterá nem quando morras.


Roberto Juarroz.............................Tradução Pedro Vianna

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Alvorada


photo: Francesca Woodman
Na madrugada ela deita com seu perfil naquele ângulo
Que, quando ela dorme, parece a face talhada de um anjo.
Seu cabelo uma harpa, que a mão da brisa persegue
E toca, contra a nuvem branca dos travesseiros.
Então, em uma explosão rosa, ela acordou, e os seus olhos abertos
Nadaram em azul através de sua rósea carne amanhecida.
Do orvalho de seus lábios, a queda de uma palavra
Caiu como a primeira das fontes: murmurou
"Querido", em meus ouvidos a canção do primeiro pássaro.
"Meu sonho torna-se o meu sonho", ela disse, "realizado.
Eu acordei de você para o meu sonho de você."
Oh, meu próprio sonho acordado então ouso assumir
A audácia do seu sono. Os nossos sonhos
Vertidos nos braços um do outro, como riachos.



Stephen Spender....................................Tradução
Pedro Vianna