quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Raíz

................................clique na imagem

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Engrenagenes




terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Papo de rádio (um poema verdadeiro)



Um entrevistador
num talk show de rádio
pede a um artista
que lhe diga se
o número de horas
que ele gasta pintando
em um ano corresponde
à quantia de dinheiro
que ele ganha naquele ano

O artista resmunga
algo sobre como
arte e dinheiro
não são compatíveis
e deixa por isso mesmo

Eu queria me meter
e dizer aquele entrevistador
cuzão que
ele estava confundindo
emprego com trabalho

Um emprego é onde se
vai para ganhar dinheiro
Trabalho (especialmente
Trabalho bem feito) é
o que dá prazer
e nada mais

Um emprego é chato
Um emprego é tedioso
Um emprego é embaraçoso
Um emprego é exploratório
Um emprego é humilhante
Um emprego é idiotizante
Um emprego é perda de tempo

Mas Trabalho bem feito
sempre dá prazer
e satisfação

Um emprego é o que você faz
cinco dias por semana
por uma determinada
quantidade de tempo
geralmente prescrito
por seu patrão
e suas necessidades
um emprego é limitador

Trabalho ocupa
todo o tempo

Mesmo quando você dorme
Trabalho é indefinível
Trabalho é eterno


Raymond Federman..................Traduzido por Pedro Vianna

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Dívida

ávida
diva

a

vida

é

diva

da
vida

ave
div
id
ida

entre
o de
vir

e
a
ida

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Elegia

para Narjara Oliveira

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Construção



aqui
onde a forma
é procura
o poema trama
um novo
estratagema:

torturar a
palavra insegura
até que surja
da chama
uma
outra estrutura

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Elo

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Limite


"Ecrire, c'est entrer dans la solitude où menace la fascination.
C'est se livrer au risque de l'absence de temps,
où règne le recommencement éternel."


Maurice Blanchot


teu corpo
retorna
ao horizonte de meu
entorno
oco de significados

toco
fincado
na tosca superfície
dos
sentidos

copo
entornado
sobre a mesa posta
do
acaso

voz
um
bertoecoando
nos corredores
da
alma

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

(ident)idade solar





do instante incendiado
galopa um crepúsculo
de
olhares desbotados
atrasando os relógios de sangue
&
a cabeleira líquida
do nada

isso (não) é o sol
cor
roendo as vestes do céu
como
inscrição sulcada
no seco solo do tempo
como
lâmina atravessando
o
murmu
rio da espera

(in)diferente
a todo estreme
cimento
derrama-se o mecanismo
(in)fatigável
do
desejo

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

O intruso




Ele invadiu, forçou a fechadura, ou roubou
a chave, e sabia o código para desarmar o alarme,

algum desabrigado, um maluco de rua, inofensivo
você poderia dizer, mas está errado: ele gosta daqui, e ele fica.

Ele vasculha meus armários e gavetas da cômoda
e experimenta minha roupa, e acontece, claro, dela servir-lhe.

Ele corre meu pente nos cabelos. Usa minha escova de dente.
Ele deita no meu lado da cama para um cochilo.

Ele instalou-se. De manhã, ele senta em meu lugar
e toma seu café com torradas, lendo meu jornal.

Ele pega meu carro e dirige para dar minhas aulas;
Durante meu período no escritório ele encontra meus alunos.

Não somos tão diferentes. Mas ele está vivendo minha vida.
Tento alertar meus amigos com quem ele janta

ou minha esposa com quem ele dorme: “Esse não sou eu.
É um impostor. Como vocês não percebem?

Ele é velho! Ele é sujo. E, também, claramente louco!
Como pode enganar-lhes assim? E como vocês o suportam?”

Eles não me dão atenção, fingindo não ter percebido.
Poderiam estar eles juntos nisso de alguma forma?

Mas qual seu propósito? Foi ele também destituído
do apartamento, emprego, e esposa? Isso lançou-lhe em desespero?

E devo eu sair agora em busca de uma vítima,
Invadir sua casa, e começar a viver sua vida?


David R. Slavitt -------- Trad.Pedro Vianna


segunda-feira, 12 de novembro de 2007

pai s agem e s s encial



língua s ar
dem delirante s
no vortex
da zona s onhabortada
onde
o
poema vomita
um entrecortado enigma
que di s s ipa o fervor da s imagen s

corpo s afogam a noite fragmentada por
reflexo s
em deva s s a convul s ão

paira s obre o s de s avi s ado s
um torpe gemido em forma de
S
barco bêbado & carregado de injuria s
ra s gando
o
dor s o da realidade

olho s vendado s s obre
o
alfabetoe a re s piração exaurindo
o
oco
da s hora s

sábado, 10 de novembro de 2007

o convite

fomos convi
dados para a festa da morte
para dividir seu re
pasto e suplicar-lhe os restos
para per
seguir seu rastro de ódio
& sangue & conduzir seu rebanho de hum
ilhados até os com
fins do esque
cimento

fomos convi
dados para o cortejo dos aflitos
para tatuar seus an
seios no tórax do poema
com a lâmina gasta nossa voz oprimida
re
velar o animal con
sumido pelos d
entes do ocaso
antes que os ossos & as horas se trans
figurem
em embarcações vio
lentas

fomos convi
dados para o baile dos afogados
para roubar-lhes as pa
lavras submersas
em igara
pés rasgados pela imagin
ação doentia
como se nada restasse além de um canto
para os que calam
ante a curva
tura dos b
arcos

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Por trás do nome

O velho sofá reclamou um ruído rouco quando Orimar tombou de lado feito animal abatido. Porém ela não disse nada. Com tranqüilidade fitou-lhe o rosto vermelho e um automóvel rasgou o dorso da madrugada. Sentiu o cheiro do álcool ecoar pela sala, como um cântico, e quase teve pena. Como ele era fraco. Não passava de um frágil organismo se debatendo em seu próprio fracasso, pensou vitoriosa. Voltou os olhos para os livros na estante tentando afastar o pensamento arrogante. O Crocodilo, O Idiota. Maldito Dostoiévski, pensou, sem saber o que fizera para merecer aquele destino. Em movimentos leves recolheu, com suas mãos poderosas, o copo, a garrafa, o cinzeiro. Não queria vestígios da violência da noite.

Ela não conseguia entender como podia ser tão fraco, o homem por trás do nome que cativara imediatamente. Orimar. Aquele nome transportava-a para um passado pulsante. Um passado com o cheiro de seu pai sentado na varanda da casa. Da infância entre meninos e peixes. Aquele nome reinventava as tardes que o pai tirava do armário a cachaça, trazia a vitrola para a varanda, e punha-se a beber lentamente enquanto o sol despencava na distância. Nas noites em que a lua surgia das águas barrentas do rio, e vinha pairar como um fantasma sobre os telhados, o pai tocava um compacto de Bienvenido Granda: En la orilla del mar. Então os versos de José Berroa se repetiam na voz do cantor cubano. “Luna, ruégale que vuelva/ y dille que la espero/ muy solo y muy triste/ en la orilla del mar”. Então o pai chorava, enxugava os olhos com suas mãos poderosas (mãos que pareciam não se adequarem a um trabalho tão delicado), chamava a filha para junto de si, e repetia a mesma estória.

Contava que Bienvenido Granda, El Bigode Cantante, no auge de sua carreira, fora traído pela esposa com seu melhor amigo. O cantor desesperado, teria assassinado os dois e fugido para o Brasil. Mais exatamente para Belém. Ali teria raspado o famoso bigode e terminado seus dias como garçom num hotel da capital. Depois da morte do pai ela descobrira que tudo não passava de uma estória furada. Uma mentira provavelmente contada por um marinheiro bêbado, num dos muitos bordeis das margens do Amazonas. No entanto ela repudiava a verdadeira versão da morte de Bienvenido, e defendia a versão do pai como se fosse uma herança. Um conhecimento secreto. Uma versão íntima.

Orimar. Bem mais que um neologismo criado pela supressão das letras e-n-l-a-l-l-a-d-e-l no título de um bolero antigo, aquele nome sintetizava um ideal construído no âmago de sua solidão. Um ideal de reencontro com as tardes de correria pelos quintais de chão batido; os banhos de rio entre meninos e peixes; a varanda da casa iluminada pela pálida luz da lua; o pai jogado no fundo da rede. O pai. Ela buscava o pai no homem por trás do nome. Orimar. Mas Orimar jamais teria mãos para enxugar as próprias lágrimas.Não havia poder algum naquelas mãos. Talvez ele não tivesse força nem para lágrimas. Ele era fraco.


Por isso ela não pediu à lua que Orimar voltasse naquela noite, mas no fundo esperava por ele com uma viciada espera pela droga. Esperava seus passos na escada; seus olhos a evitá-la; sua arrogância incontida; e, sobretudo, ela esperava por sua crueldade. Sua crueldade que mesmo agora, tombado como um cadáver no sofá, ele exercitava absoluto. Por um momento pensou em matá-lo. Sim. Poderia matar facilmente aquele homem fraco, mas o pensamento era demasiado, artificial. Ela era muito forte para a crueldade. Herdara além de uma versão intima sobre o fim de Bienvenido, as mãos poderosas do pai. Mãos que trariam o ventilador para a sala. Cobririam o corpo sujo de Orimar. Mãos que enxugariam as próprias lágrimas.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

A Ligação

Era uma voz inesperada. Uma voz há pouco esquecida num canto qualquer do passado, aquela que vazava, como sangue, pelos buracos do telefone. Ainda entorpecido pelo sono, chegou a pensar que fosse sonho aquela voz agora reconhecida: era ela, cuspindo palavras como se fossem pedras. Palavras num ritmo frenético, descompassado. Palavras como pequenos pássaros esmagados pelo sono. Parecia desesperada. Na certa aprontara uma das suas e não tinha outro otário para recorrer à essa hora. As palavras se perdiam. Tudo que pode anotar foi um endereço: Campos Sales esquina com General Gurjão.
*
Tentou virar de lado e voltar a dormir. Voltar ao mundo do sono e do esquecimento onde ela não mais existia. Não. Não havia mais espaço para ela em sua vida. Não. Não devia pensar em nada. Mas aquela ligação… Às 3 da manhã depois de 6 meses sem noticias, sem seus olhos indecifráveis rondado a sala. Seis meses desde o dia em que ela lhe deu às costas num bar fedorento e sumiu. Não. Não. Era melhor esquecer. Voltar a dormir. Ela que se fodessse com seus problemas. Ela sempre só lhe trouxe problemas, problemas, problemas. Não. Não. Do tempo que passaram juntos quase nada restava: um livro nunca lido de Borges com uma dedicatória estranha: ”A ti, que não compreendes a tessitura efêmera da eternidade, a lâmina impiedosa rasgando a carne dos sentidos”; e uma cicatriz indelével de uma mordida nas costas. Uma cicatriz que agora voltava a pulsar como um organismo autônomo instalado em seu corpo.
*
Voltou a ler o endereço. O que faria ali, em plena zona? Teria virado puta? Ou só estava novamente perdida? Novamente buscando uma vida a qual pudesse se agarrar como um parasita? Vindo dela tudo podia ser. Não. Melhor esquecer. Sim, dormir, dormir. Era perda de tempo. Ela sempre fora fluída. Sempre em fuga. Jamais seria domesticada. Era essa sua natureza: viver em fuga como um bicho afugentado. Mesmo nas horas em que estavam sozinhos no quarto ela conseguia fugir. Fugia para dentro de si e nada era capaz de trazê-la de volta, como se ela pairasse acima de tudo numa realidade paralela. Numa realidade onírica, pessoal, intransponível.
*
Tentou de todas as formas trazê-la para seu mundo. Puxá-la a força para o chão. Guardá-la para si. Tentou de tudo: apresentou-lhe os amigos, levou-lhe a lugares inusitados, deu-lhe presentes, deu-se, doou-se, danou-se. Mas era inútil. Não havia o que lhe bastasse. Era como se ela ansiasse por algo intimo e imperscrutável. Algo além das coisas e dos seres. Era como uma sede insaciável. Sede do infinito. A sede dos náufragos e dos viajantes sem destino, e nada podia aplacá-la. Somente nas horas que trepavam ela deixava que algo escapasse. Algo ínfimo. Contorcia-se de prazer e o apertava forte. Rasgava-lhe as costas como se o quisesse inteiro dentro de si. E talvez fosse esse seu único intuito: queria absorvê-lo, consumi-lo em seu fogo secreto. Não. Não. Ela jamais se entregaria. Ela sequer tinha um nome. Seu nome era seu corpo. Aquele corpo que o esperava na esquina da Campos Sales com General Gurjão. Aquele corpo indecifrável, que um dia carregara em desenfreada fuga uma parte de sua alma.E o telefone voltou a tocar.

sexta-feira, 27 de abril de 2007

Palavraprecipício


“Un pion pourrait se faire un bagage littéraire,
en disant le contraire de ce qu’ont dit les poètes de ce siècle.
Il remplacerait leurs affirmations par des négations.”

Isidore Ducasse


Não sei ao certo de que buracos
saíram estas noites que vagam por aí, como vírus,
apunhalando-me os nervos com tal violência,
feito uma nova vileza secreta.

Guardo um velho sonho , uma mordida seca e larga,
uma mão miúda, como a de minha mãe,
que me embala e me espanca,
jogando-me dentro de uma rede encardida,
coberta por um mosqueteiro.

Posso ver seus olhos outra vez...

Guardo uma cicatriz desconhecida,
feita de falta de trabalho ou de tempo.
Talvez uma tristeza de quem já não consegue ser nada.

Sofrer não é muito diferente de fugir.
Seria uma merda se um desconsolo ou outra coisa
pudesse ser adiada até o desaparecimento.

É fácil ser influenciado pela morte.
E penso sempre o mesmo,
se existirá a ausência de movimento,
se não seria melhor ficar em casa
mais tempo, mais vezes.

Claro que já não tenho mais sangue no coração.
É uma das condições que me fazem
calar sobre o que me cerca.
Não preciso estar triste para destruir seja o que for.

Meus amigos têm medo que eu morra,
eu que sempre exercitei a covardia,
a indiferença, o tédio,
a desgraça. Eu que perdi toda a dignidade.

Quando faz sol, as ruas vestem-se de pessoas
que evitam o sol com as mãos abertas. O sol é triste.
Parece uma palavra caindo do céu.

O mundo junta os pedaços,
junta as peças debaixo de meus pés.

O sol parou. Caras desconhecidas enchem-me o coração.
Projeto meu futuro esquecendo delas.
Saindo de um motel pra beber cerveja.
Mal disposto como quem está preste a nascer.

Alguém me abandona nisto.
O dia sobe como uma pedra. As pessoas desaparecem.